ARKIVÃO

ARKIVÃO - espaço para reunir o que vou escrevendo ao longo do tempo, e que se encontra espalhado por aí; arkitectura, referências a terra de origem, divagações disléxicas; tentativa de organização, mas sem critério e por vezes sem cronologia; organização anárKica, incompleta, de conversa da treta, assinada através de diversos pseudónimos.... mas nem tudo estará aqui. Anabela Quelhas

Friday, September 29, 2006

QUE SE CUIDEM!

O termo ateu, significa ausência de Théos.
Ser-se ateu, não significa perfilar uma qualquer crença ou sistema filosófico, ideológico, político ou organização social.Ser-se ateu é ser-se livre, racional, não dogmático, ultrapassando a posição agnóstica das escolhas e das incertezas.
Assim me sentei na igreja de S. Domingos, na baixa lisboeta, num sábado de tarde, neste mês de Sto António, reflectindo sobre isto. Passam-se anos, e eu esqueço-me daquele espaço! ... para mim, é único, junto à baixa pombalina. Naquele dia dei-me ao luxo de lá estar duas vezes, de manhã, de tarde - oi Zé! Hello Olga!
O ateísmo já deu direito à fogueira!Sentei-me a reflectir, a recordar cada parede brutalmente nua, cada coluna, rude, áspera, cavernosamente a testemunhar a história, e as aflições dos humanos, desde o sec. XIII. Recordei-a como local de referência da dinastia de Avis, de baptismo de judeus que forçosamente se converteram em cristãos, visualizei as chamas e vivenciei os ritmos vertiginosamente sísmicos de 1755.
Senti a indignação dos crentes perante o terror da peste, nas ruas quinhentistas.
Fechei os olhos e senti os sons... na ausência deles, os cheiros da "heresia" e do sal espalhado pelos terreiros por ordem de um Iluminatti e de outros ainda mais sombrios.
Continuei a sentir o cheiro adocicado de carnificina de todos os mártires desta Lisboa feita de mourarias.
Que se cuidem, Camus, Sartre, Freud e tantos outros! Que sorte viver dois séculos mais tarde!
"Fé é não querer saber o que é a verdade" ... mais outro, Nietzsche!
Oh Galileu Galilei!!!! Escapaste por pouco!
Imaginei o silêncio, seccionado pelas rezas, pelo recolhimento dos dramas de todos, na esperança de escutar algo divino, que justifique tudo o que se passa na vida de cada um.
Ser-se ateu é respeitar a fé dos outros, ser-se solidário, e se possível ajudar a reforçar a crença ou mesmo a fé de um amigo, que lhe serve de eixo orientador em dado momento, apesar de não acreditar... apesar de não crer... mas emprestar o coração a fundo perdido.
Respirei fundo, esquadrei cada recanto com o meu olhar observador, distraindo-me na ausência de ornamentos, na pureza do vazio generalizado.
Filtrei ainda mais a luz acolhedora, com um piscar de olhos, galgando memórias até ao infinito.
Questionei incertezas, configuradas ao longo dos anos, e outras, frescas, mas não menos importantes e essenciais em mim.
De que é feito um ateu?
Confirmei a simetria da nave, percorrendo o eixo longitudinal, na certeza de assumir toda a responsabilidade sobre os meus actos, assumindo a consciência de mim... será isto um ateu?
Sentir a liberdade de poder sentar-me em qualquer espaço, de recolhimento ou... nem tanto, confrontando-o comigo e respeitando sempre os diferentes.
A fogueira queimava realmente! pira de lenha, elemento essencial, em cerimónias que obedeciam a rituais rigorosos, rituais de terror e de medo levado às ultimas! Autos de fé, resumidos a tortura, penitência e morte - A queima como espectáculo, como acto piedoso de assar gente viva.
Sou simples, cumprindo a fé em mim, sem espreitar em qualquer tipo de narcisismo.
"Ser ateu é ater-se ao presente e simplesmente vivê-lo..." gosto desta frase escrita nem sei bem por quem...
...percorri o perímetro da igreja, tentei adivinhar os dramas que cada rosto encerra, abrindo-se em esperança do acender de uma vela.
Atravessei o guarda vento, desviei-me dos mendigos, que teimam em habitar na minha consciência, e saí.
A. Quelhas
editado em www.sanzalangola.com em 29/06/2006

Tuesday, September 26, 2006

GREVE

Uma greve é uma forma de luta extrema.
O referido documento chegou às escolas no final da semana passada. È necessario informar, discutir e só depois se vai para uma greve. Mas é claro, uma greve nunca agrada a todos! Em vez de se analisar os motivos da luta, analisa-se normalmente a calendarização.
Olhem as críticas:
inicio do ano lectivo - destabiliza a integração das criancinhas
durante a avaliação - péssimo porque afecta as criancinhas
a meio da semana - péssimo por causa da alimentação das criancinhas, e interrompe o ritmo da aprendizagem.
à sexta - mau porque assim o fim de semana começa mais cedo
à segunda - péssimo, porque o fim de semana termina mais tarde.
aos exames - um escandalo.
Enfim, uma greve boa seria localizada no período de férias por forma a prejudicar pouca gente, só mesmo o salário do prof!

O Granito

O JL desta semana dedica quase duas páginas à arquitectura brutalista, a propósito da Fundação Calouste Gulbenkian - o edifício da fundação foi um dos primeiros a assumir o aspecto e a textura do betão descofrado, aqui em Portugal.
Tenho uma simpatia especial pela visualização dos materiais de que os edifícios são feitos... e não passa pela perspectiva economicista; è mesmo atracção estética pelas texturas, as cores, as clivagens, a pigmentação dos materiais, e os encaixes resultantes das técnicas construtivas e capacidades estruturais de cada material. Gosto do natural, do autêntico, do verdadeiro, tanto na arquitectura como em tudo na vida. Gosto de olhar, nos olhos das pessoas e mergulhar bem fundo.
Diz-se que esta influência da Escola do Porto, é de inspiração Corbusiana, o que me parece uma análise empobrecida e limitativa.
A "verdade" dos materiais não é uma tendência estética importada de Le Corbusier, faz parte do nosso património arquitectónico, especialmente da zona norte de Portugal.
A utilização de reboco pintado nas paredes, é uma moda que se manifesta apenas a partir do neoclássico/barroco, por forma a obter contraste de luminosidade com as molduras dos vãos de janelas e portas, que se apresentam em granito à vista, mais polido e perfeitamente talhado; preenchendo assim a grande superfície dos edifícios.
A arquitectura popular do norte, tem assumido ao longo de séculos, a visão integral do granito... rocha dura, rude, difícil de trabalhar - e que aos poucos volta a ganhar expressão, na recuperação de alguns edifícios..., mas está a virar moda, e a iliteracia arquitectónica de alguns técnicos, tendêncía para a asneira.
Picar edifícios e desnudar o granito, dando-lhe o tal aspecto rústico, não se concilia com as tais molduras perfeitamente geométricas do barroco ... resulta num mau exercício.
O mergulho no olhar, só é edificante quando se encontra algo genuíno.
Anabela Quelhas

Escola Pùblica, Escola Privada, ainda

Fernando:
É evidente que há interesses mais ou menos camuflados, para desvalorizar a Escola Pública.
No entanto eu e a maioria dos meus colegas, não se revêm certamente no grupo dos maus profissionais, na má qualidade do ensino, ... etc, etc.. - estamos sim, conscientes que a Escola Pública, envolve uma problemática social diferente, por tentar servir a todos, e encontra-se destruturada para enfrentar os problemas de hoje, tentando ignorar o problema da indisciplina e da violência. E não estamos sós!!!! mas não me venham com comparações com a Finlândia!!!Pelo que conheço, efectivamente, há muitos pais que optam pelo Ensino Privado, para que os seus filhos estejam ocupados durante todo o dia, o que facilita a organização familiar, para que frequentem actividades extra curriculares que a Escola Pùblica ainda não oferece e porque evitam aos seus filhos a vivência de alguma violência e indisciplina. No entanto é bom não esquecer, que é através da escola que os nossos jovens se integram no mundo real, e mais, a Escola Publica, com toda a sua complexidade, é factor de algum equilibrio de algumas desilgualdades sociais, e evitando que muitos jovens se convertam em marginais, ou que ingressem no mundo do trabalho infantil.
Eu sou pela liberdade de escolha,... só não entendo porque os impostos dos contribuintes são frequentemente canalizados para apoiar escolas privadas em detrimento das públicas. Ou seja... entendo!::: Mas discordo!!!!
Anabela Quelhas
Luís- As instalações de colégios que abriram há pouco mais de 5/6 anos, ou que procederam a obras de remodelação, usufruiram de fundos perdidos ou de juros altamente bonificados.- Ampliação de fundos documentais de bibliotecas.- Formação, etc, etc-
O orçamento anual do ministério da educação contempla o apoio à privada.
Apesar de todos os problemas, a Escola Pública não se esgota em problemas, há muita coisa positiva que se faz por este país fora, e a escola continua s ser factor de influência positiva, na formação cívica da maioria dos seus utilizadores.
Se consultares alguns documentos sobre insucesso escolar, verificas que a maioria dos alunos que abandonam a escola antes de concluirem a escolaridade obrigatória (15 anos), se convertem em marginais a tempo inteiro ou ingressam no mundo do trabalho infantil.
Eu tambem sempre frequentei escolas públicas, e nunca fui protegida no contacto do mundo real.
Tenho um filho e claro que está numa escola publica... tem colegas indisciplinados, e por vezes vive a violencia da escola, e depois? rapidamente aprendeu a conhecer o que são carências, desigualdades e tem uma lição diária sobre o que é liberdade de decidir.
Um abraço
Anabela Quelhas
Luís
- As instalações de colégios que abriram há pouco mais de 5/6 anos, ou que procederam a obras de remodelação, usufruiram de fundos perdidos ou de juros altamente bonificados.- Ampliação de fundos documentais de bibliotecas.- Formação, etc, etc
- O orçamento anual do ministério da educação contempla o apoio à privadaApesar de todos os problemas, a Escola Pública não se esgota em problemas, há muita coisa positiva que se faz por este país fora, e a escola continua s ser factor de influência positiva, na formação cívica da maioria dos seus utilizadores. Se consultares alguns documentos sobre insucesso escolar, verificas que a maioria dos alunos que abandonam a escola antes de concluirem a escolaridade obrigatória (15 anos), se convertem em marginais a tempo inteiro ou ingressam no mundo do trabalho infantil.
Eu tambem sempre frequentei escolas públicas, e nunca fui protegida no contacto do mundo real.
Tenho um filho e claro que está numa escola publica... tem colegas indisciplinados, e por vezes vive a violencia da escola, e depois? rapidamente aprendeu a conhecer o que são carências, desigualdades e tem uma lição diária sobre o que é liberdade de decidir.
Um abraço
Anabela Quelhas

Friday, September 22, 2006

Mais ensino



O problema da escola portuguesa não é tanto, quem entra ou não na Universidade,... felizmente!
É necessario reflectir e admitir quanto importante é a escola, para a grande maioria dos alunos, que não vão para a Universidade.
O grande problema é como gerir e reorganizar a chamada escola democrática, que efectivamente não o é.
Continuamos sem saber como superar as desigualdades sociais existentes entre os seus utilizadores.
Como ultrapassar as diferenças entre os handicaps culturais que cada aluno transporta para a escola?
O ensino privado tem sucesso? Claro que sim, visto que selecciona logo à partida o seu acesso pela capacidade económica das familias.
A sociedade esta em crise, é tudo menos democrática, e a escola é o reflexo disso.
ESCOLARIDADE OBRIGATÓRIA, SIM!
ESCOLA PÚBLICA, SEMPRE!
Anabela Quelhas

rotina de um prof

Conheça a rotina de um professor - será que somos previligiados?
- 22 horas semanais a debitar aulas em turmas heterógeneas, normalmente de 25 alunos, onde a sua acção ultrapassa a mera função de transmitir conhecimento cientifico
- resolver problemas disciplinares, de falta de atenção, criar estimulo continuo á aprendizagem, corrigir erros de português, quer na escrita quer na oralidade, ser amigo, promover a multiculturalidade e a formação cívica, leccionar áreas não disciplinares, como Formação Cívica, Área de Projecto e Estudo Acompanhado.
- Serviço de secretaria - registo de faltas, controle de assiduidade dos alunos, contactos escritos ou telefónicos com os encarregados de educação e fazer matriculas.
- Desempenhar funções de director de turma - fazer a ligação aos encarregados de educação, envolvendo disponibilidade para contactos semanais, fazer a ligação com o conselho executivo, gerir os problemas disciplinares, coordenadar a elaboração do projecto curricular da sua turma.
- Coordenadar os trabalhos nos conselhos de turma.
- Desempenhar funções de coordenação de departamento e participar nos conselhos pedagógicos.
- Participar em reuniões diversas (2 por mês) - do grupo e departamento, de directores de turma, de projectos.
- Participar nos conselhos de turma - cada professor tem em média 6/ 7 turmas, portanto ao longo de um ano, terá participado no mínimo em 42 conselhos de turma.
- Organizar visitas de estudo e acompanhar e responsabilizar-se pelos alunos que acompanha.
- Colaborar e promover as actividades que constam no plano anual da escola.
- Elaborar relatórios ou actas de cada actividade em que participa.Realizar actualização profissional.
- Participar em acções de formação profissional sempre em horário pós laboral.
- Organizar processos disciplinares, sempre que sejam solicitados.
- Analisar os manuais que são enviados anualmente pelas editoras, e formular uma avaliação.
- Preparação diária de aulas, que podem ser de 3 níveis de ensino, e planear unidades a médio e longo prazo.
- Correcção de exames, testes e de fichas de trabalho.Preparação de materiais didácticos.
- Criação de fichas, de testes, de exames, respectivas matrizes e planos de apoio.
- Planear a articulação horizontal e vertical de competências.
- Avaliar e criar estratégias de recuperação adaptadas a cada aluno.
- Aulas de apoio
- Criar planos de aprendizagem e aplicar estratégias diferenciadas para alunos do ensino especial
Acrescida de este ano lectivo de:
- Aulas de substituição (um verdadeiro paradoxo! não são componente lectiva, mas afinal devem ser)
E ainda:
- Ser simpatico, inteligente, bem humorado, perspicaz, desenvolto, tolerante, amigo, versátil, organizado, dinâmico.... e estar atento que em relação aos alunos, cada caso é um caso.
- Colegas, acrescentem o que falta, pois a lista está incompleta...
editado em www.sanzalangola.com em 6/06/2006

Ensino

Li em diagonal estas duas páginas, e verifico que já muito se escreveu sobre o nosso ensino, sobre a proposta para remodelação do estatuto da carreira docente, etc.. etc.
(Efectivamente eu terei a sorte de passar a ser professora titular, no entanto o meu colega de grupo, apenas 5 anos mais novo, só o poderá ser daqui a 17 anos, ou seja quando eu me reformar, seja ele competente ou não.)
Para quem não sabe, refira-se que os professores sempre foram avaliados, e a mudança de escalão nunca foi automática. O professor tinha que elaborar um relatório de reflexão sobre a sua actividade escolar, posteriormente apreciado por uma equipa de professores nomeada pelo conselho pedagógico da escola, com a seguinte escala de avaliação: não satisfaz, satisfaz, bom e excelente.
O estímulo ao bom desempenho do professor também está contemplado no actual estatuto, através da avaliação de excelente, só que aos nossos governantes, nunca deu jeito regulamentar devidamente este item do presente estatuto. Ao longo dos últimos 10 anos, alguns professores candidataram-se à avaliação de excelente, entendendo que desenvolveram um trabalho inovador e com qualidade, no entanto o ministério nunca fez um esforço para proceder à tal regulamentação, inviabilizando completamente o tal estímulo referido atrás, e merecido por muitos docentes.
Os professores não precisam de um novo estatuto, precisam que o anterior seja regulamentado na sua totalidade.
Ainda sobre as imagens que passaram na tv sobre o ambiente da sala de aula, que envolvem violência, parece-me que ficou a ideia que seriam situações pontuais passadas nas escolas dos grandes centros urbanos, PURO ENGANO. As imagens são frequentes em todas as escolas, sejam elas dos grandes centros urbanos, ou não. Todos os professores estão familiarizados com isto, seja fora ou dentro da sala de aula. Pois é, agressão, entre alunos é o dia a dia, agressão aos professores são menos frequentes, mas não escolhem, escola nem cidade. Mas mais grave, é verificar-se que o comportamento de muitos alunos, não são mais, do que o reflexo do que se passa no seu meio familiar. Sim os papás destes alunos são iguais ou piores, e irão avaliar (como se pretende) a acção do professor.
Mas tão ou mais grave do que a violência física, é o permanente boicote às aulas e à acção do professor, na sua interacção diária; ou então a turbulência permanente dos alunos que não sabem estar numa sala de aula, pois têm interesses divergentes da escola, obrigando o professor a interromper continuamente a sua aula.
Quero ainda frisar, que não vejo ninguém nos media a reflectir sobre a escolaridade obrigatória, o processo de socialização de alunos problemáticos, etc. etc.
Politicas economicistas e educação, definitivamente, não combinam bem!
Alunos problemáticos só deixam de o ser, se tiveram um acompanhamento quase individual, de um professor. Fica caro ao ministério da educação, mas fica muito barato à sociedade! Acreditem.
Agora, surgem com imensos anos de atraso, saídas através de mais cursos profissionais. Será que a nossa ministra pensa que as antigas escolas industriais ainda tem as mesmas salas e os equipamentos de há 30 anos atrás? (as salas foram adaptadas às novas exigencias da escola, foram subdivididas, transformadas em pequenos auditorios, em polivalentes, mini bibliotecas...). Ou será que ela pensa que para além de toda a polivalência que caracteriza os professores destas últimas décadas, também vão conseguir fazer omoletes sem ovos?
Só para finalizar... dáva-me imenso jeito trabalhar as 35 horas na escola. Poderia esvaziar um compartimento aqui em casa, deixava de carregar diariamente uma pasta cheia de manuais e outros materias de apoio, dava descanso à impressora e ao PC aqui de casa, poupava electricidade e aquecimento no inverno.
Anabela Quelhas
editada em www.sanzalangola.com em 6/06/2006

Thursday, September 21, 2006

RABISCOS

Entre a confusão de rabiscos, que habitam o estirador, faço uma pausa, fumando o meu "drums", naquele ritual mecanicamente apreciado, e passeio à volta dos papéis, utilizando pontos de vistas diversificados. Reflicto sobre a intersecção de planos, sobre a estética, sobre a persistência de que é feito um arquitecto.
É tão fácil desistir!
Seria tão fácil desenhar aquelas casinhas de telhadinhos à novo rico, ou os edifícios à pato bravo!!!!.... garages amplas, casas germinadas (germinam meus amigos!!! e como germinam), cozinhas regionais, alpendres, correntinhas nas esquinas dos telhados!!! algumas pessoas gostam!
Como se gosta do mau gosto!!!
Uns azulejos pintados no estilo padeira de Aljubarrota, um laguinho... umas janelas de alumínio que se integram tão bem na nossa paisagem lusitana!!! Mas nem sempre o fácil é bonito, nem o complicado é belo! A perfeição é dificil de atingir! E consciencializa-nos da necessidade de humildade que devemos ter em nós para nos respeitarmos.
Que falta de chá, existe à nossa volta! Nem as aulinhas de religião e moral safaram certa malta!!! Os brasileiros são especialistas em criar frases que espelham bem a falta de ética e de estética que abunda à nossa volta e que alguns orgulhosamente ostentam. Lembro-me de algumas, e sorrio...
Rabisco mais um pouco, dou efeito de sombreado para realçar formas, para ajudar a decisão continuada!
Continuo a minha marcha criativa, mas ainda circular. A avaliação constante que faço de tudo, torna-me numa resistente... que raio de metodologia se apoderou do sangue que me corre nas veias, para todo sempre? Obrigada, meus mestres! para além da resistência física, dada pelos dias mais chuvosos desenhando pelas ruas da cidade tripeira, a resistência da teimosia!... o aprender a não desistir... transformar as derrotas em vitorias! São sensíveis os arquitectos! As arquitectas também..., mas, quando tudo indica o caminho da desistência, renasce a capacidade de começar tudo de novo, com energias renovadas. Uma questão de sobrevivência, dirão uns; será muito para além disso, será uma questão cultural e de rumo que damos à nossa existência para que ela mereça ser vivida.
Mais uma voltinha, espreito pela janela, oiço pela milionésima vez Cohen em "There for you", que me faz sonhar.
Utilizo a cor, para uma aproximação à realidade, rejeito esquiços, reaproveito outros, adiciono pormenores esquecidos, sempre numa procura constante de reforçar qualidades, que têm a ver apenas comigo mesma... alguém me diz "Já foi tempo em que as mulheres não saíam da cozinha!"
Claro que sim, mas uma cozinha é tão importante no funcionamento de uma casa, onde tudo se organiza o mais ergonómicamente possível, onde se equacionam quase todas as tarefas de sobrevivência de um lar!!!... ou será que me disse "tu não és pessoa para ficar atrás dos tachos!". Que diferença fará?
Há cozinhas lindas, belíssimas onde apetece estar e habitar... mas afinal eu tenho é que integrar alçados com cozinhas, distribuídas por vários pisos, e lá fora está a terminar um dia cheio de sol, a cheirar a quente.
Querem lá ver que já está na hora de jantar?... jantar fora, claro!

uma e outra vaga


Entre uma e outra vaga, surge a pausa que o Zulmarinho nos presenteia... o espaço para reflectir a dimensão que cada um procura dentro de nós - o supostamente certo, o antecipadamente duvidoso, os pensamentos certeiros e aqueles que erram completamente o alvo, e os desconfortáveis "assim, assim",... não se dissolvem nunca, ficam suspensos e boiando na tal linha feita de azul. Alivia-nos o peso da alma, mas retrai as escolhas e os processos de decisão.

M.C. Escher

M. C. Escher (1898-1972)
Enfrentando noitada, atrás de noitada, manuseando a régua e o esquadro, num turbilhão de riscos e rabiscos, envoltos em nuvens de Drums (tabac à rouler), ouvíamos Bowie, ainda revivendo a fase Ziggy Stardust, ou apelando ao Satisfation de Jagger, para espantar a onda de sono, que sorrateiramente nos espreitava, sem dó nem piedade...... foi assim que dei inicio à descodificação de M. C. Escher!
JJJ nas suas viagens, Porto, Utrech, Porto, abastecia-nos de novidades, no mundo das artes, dos conceitos, da música e especialmente da arquitectura. A boa onda de JJJ que não esqueci até hoje!
Sobre os estiradores deslizavam Léon Krier, Rossi, Taffuri, Scarpa, Kahn, em orgias de utopia, que intervalavam com desânimo, cansaço, e motivação para continuar e não desistir nunca!
Escher preenchia as nossas pausas deste fervilhar de ideias colectivas, permitindo a nossa entrada, noutra dimensão, virtual, que necessitávamos com urgência e nos preenchia o sonho, a falta de razão, os paradoxos reencontrados.
Uma perfeita Viagem!!!!!!!!!!!!!!! a outras dimensões do impossível, convertido em possível, em cada pagina, que desfilava diante do nosso olhar e dos nossos sentidos... A ilusão da 3ª dimensão, os erros propositadamente estudados e cuidadosamente desenhados, através da perspectiva rigorosa construída a partir de um jogo intelectual sem limites, assistiam a todo este caldo de conhecimento e reflexão.
***
O rigor geométrico na construção de padrões decorativos, utilizando como módulos, peixes, repteis, aves... desdobra-se em malhas geométricas que saiem do conceito do vulgar e entram no mundo fantástico, através do movimento e da ilusão, da sugestão espacial, da metamorfose ilusória.Tudo parece fácil e simples!
Só um génio é capaz de expressar a união e a transição entre a matemática e geometria, traduzindo-a em algo de belo, atraente, que prende o observador e convida-o a investir numa outra dimensão repleta de surpresas. O observador deixa-se seduzir, deixa-se iludir conscientemente e aprecia este acto de evasão, absolutamente novo.
A obra de Escher é toda ela um exercício de rigor e disciplina invulgares, oscilando entre o que é a verdade e o que é a ilusão.
Escher mostra-nos como pode coexistir o côncavo e convexo em simultâneo, como no mesmo momento e no mesmo lugar, se pode subir e descer escadas, como se pode estar dentro e fora... complicado!!! Contraria as leis da física... sem dúvida!!! Onde está um corpo, não pode estar outro!!!!
A utilização frequente do preto e branco, explorando o seu contraste, relaciona-se com o dualismo do seu pensamento e do seu carácter, consciente dos extremos, do Bem e do Mal, do feio e do belo. Escher não é um surrealista é um criador de mundos impossíveis.
***
... cada Viagem proporcionava-nos emoções capazes de aquietar ansiedades, de acalmar interrogações constantes, e abria-nos sempre caminhos na resolução de problemas arquitectónicos, que pacientemente nos aguardavam repousando nos estiradores, abandonados ao acaso, mediante a fuga à realidade...
Anabela Quelhas
editado em www.sanzalangola.com em 30/04/2006

Tuesday, September 19, 2006

GUADALAJARA

ENCERRAMENTO DA CENTRAL NUCLEAR DE GUADALAJARA (HOJE)
Zapatero parece que vai cumprir com sua promessa de encerramento e desmantelamento da central nuclear de Guadalajara, ganhando assim respeitabilidade como firme opositor ao nuclear.
Outras se seguirão?...
O receio de acidentes em centrais nucleares, continua presente na nossa vida global!
Quem esqueceu Chernobyl?
Quem ficou indiferente a outros acidentes menores que ocorreram na Rússia, Japão e Estados Unidos?
Na produção de energia nuclear, a segurança evoluiu desde Chernobyl, mas continua a mostrar-se incontornável; os riscos são diversos e todos graves, para nós e para as gerações futuras: os erros humanos, o transporte de matérias, o armazenamento dos resíduos radioactivos e a utilização como alvo em ataques terroristas.
A.Quelhas
editado em www.sanzalangola.com em 30/04/2006

Vejam a diferença

Resposta a um sanzaleiro amigo, que me questionou irónicamente, se eu projectava à Raul Lino. Apesar de muito apreciar a obra de Raúl Lino, e que deve ser motivo de orgulho dos Tugas, eu vivo no século XXI, e os meus modelos são mais actuais e bem diferentes... NEM SEMPRE ME DÃO OPORTUNIDADE DE OS EXPLORAR!!!! Quem quiser ver as diferenças...
A. Quelhas
editado em www.sanzalangola.com em 21/04/2006

JOHN MAYALL

Hoje revisitei John Mayall pai do blues branco, e especialmente o seu John Lee Boogie dedicado ao monstro, Jonh Lee Hooker. Aprecio a sua paixão pelos blues, apesar de ser branco e britânico e de Manchester nestas ondas de blues, tudo é importante também, e existem os apesares e os no entantos ... a cor da pele é importante, sim!!!!!
Os blues são um género musical absolutamente negro capaz de despertar a paixão e a admiração dos não negros; as suas origens estão directamente ligadas à emancipação dos negros americanos e que se traduz num lamento sonoro, profundo que não nos deixa indiferentes.
A vasta cultura musical de John, a sua grande capacidade intelectual e a sua técnica instrumental possibilitou-lhe explorar criativamente o boogie-woogie, o jazz e o country.
Nota importante: este grande senhor foi um grande impulsionador na formação de vários grupos musicais e claro de ... Mick Taylor e Eric Clapton.
Mayall esteve em Portugal em Novembro de 2003.
Hoje revisitei John Mayall, recordei a gigantesca nuvem de fumo, iluminada pelas luzes dos estiradores, num ambiente propositadamente escurecido, ao fim da tarde, em S. Lázaro; um outro João que não o Mayall, no seu escape de reorganizar-se, traduzido em musicalmente azul, premiando-nos com estas sonoridades, intervaladas com sabor a rum, ampliando a nossa inspiração através de um verdadeiro feeling e enriquecendo-nos sempre.
Eu não gosto de fado mas amo blues!!!! Permite-me fechar os olhos e perder a noção do tempo...
Anabela Quelhas (Osíris)
Editado em www.sanzalengola.com em 10/05/2006

Sunday, September 17, 2006

FRACTAL

Osiris
Quero felicitar-te pela forma como colocaste a importância da estereoscopia e mais do que isso, o enfoque no que seja a realidade e a sua percepção.
Por acaso, a tecnologia da aerofotogrametria ( com que eu trabalho ), com a qual se fazem os mapas plani-altimétricos se baseia exatamente na estereoscopia, já que sem a perpectiva tridimensional seria impossível a representação gráfica do relvo. É por isso que as fotos aéreas sempre incluem uma sobreposição longitudinal e lateral, de forma a que o mesmo objeto fotografado no solo, esteja representado em duas fotos sequenciais, em perpectivas diferentes, para que surja a paralaxe.
Referindo-me à formação da imagem no nosso cérebro, para a percepção visual, tenho para mim que ela talvez seja diferenciada, em maior, ou menor grau, de pessoa para pessoa. Os bastões e bastonetes que se localizam por detrás da retina, são sensibilizados pelos raios luminosos e "constroem o quadro" que é enviado ao cérebro, como se fosse uma imagem scanerizada. Os cachorros e outros animais, por exemplo, não possuem bastonetes, responsáveis pela captação da radiação nas frequências que envolvem o espectro colorido. Têm somente os bastões, pelo que apenas vêm tudo em preto e branco.
Ou seja. a realidade "vista" pelos cachorros é bem diferente da nossa. É apenas em preto e branco. De igual forma a capacidade olfativa deles é milhares de vezes superior à nossa. Ou seja, as nossas realidade em termos de cheiro são bem diferentes.
Por acaso, eu não tenho visão na vista esquerda, pelo que não possuo estereoscopia. Assim, a minha visão tridimensional, necessária por exemplo para percepção de distância quando estou estacionando o carro, resulta apenas de elementos de memorização ( de quando eu via com as duas vistas ). No mais, é como se toda a minha realidade percebida pela visão, fosse como que um écran gigantesco ( bidimensional ).
Como muito bem sabes, são admiráveis os artistas que trouxeram para seus quadros a "visão tridimensional". Destaque para Salvador Dali e sua arte surrealista, mas ao mesmo tempo bem real.
Ainda sobre o número de dimensões na física e sua representação na arte quero destacar o FRACTAL. É a partir dele que surgem aquelas imagens em computador, tão usadas em descanso de tela ( espirais, p.e. ).
Elas são feitas usando-se funções matemáticas exponenciais complexas, em que a potência não é um número inteiro, mas sim uma fração ( por isso a denominação de fractal ).
Numa explicação simples ( se bem que incompleta ) Imaginem uma equação que não seja nem do segundo nem do terceiro grau, mas sim de 2,5. Algo que não é nem bidimensional nem tridimensional.
Já repararam numa simples couve-flor?
Cada um daqueles pequenos componentes brancas que compõem a coroa da couve-flor, tem exatamente a mesma morfologia que a couve flor completa. É um exemplo de fractal na natureza .
Fernando
Fernando:
De facto nem todos os animais têm visão binocular, devido à posição dos olhos em cada um dos lados da cabeça (os cavalos por exemplo); mas nos humanos, é uma caracteristica que atesta a nossa evolução em relação aos primatas, todos possuimos essa capacidade inata de fundir no cérebro as duas imagens.
A arte fractal, que muito bem descreves, integra-se também no grupo de inspiração virtual. Tem como base a geometria e o calculo matemático, e consolida-se actualmente com as possibilidades dadas pelos computadores e as novas teorias da biologia e física. Porém é um caminho distinto da arte dos estereogramas. Na arte fractal, penso eu, que a tendência é o rigor matemático se sobrepor à própria criatividade do artista, o q contraria a própria subjectividade, implícita na arte.Sempre atento e colaborante. )
Um abração,
Anabela QuelhasQuelhas

ESTEREOGRAMAS

"Um estereograma é uma técnica de ilusão de óptica, onde a partir de duas imagens bidimensionais complementares, é possível visualizar uma imagem tridimensional utilizando técnicas especiais para isso." Wikipédia
Aqui no nosso rectângulo vermelho e verde, há uns anitos atrás, um jornal semanal, dava como brinde aos seus leitores, pequenas imagens de estereogramas. Este gesto simpático, gerou muita desarmonia familiar, e levou muitos tugas, a estádios de completa frustração, por verificar que não possuíam a tal capacidade de ver a tridimensionalidade das referidas imagens.
As famílias desocupadas, ao fins-de-semana, dividiam os seus elementos, entre os que viam e os "outros".
Ficando o grupo dos que viam, com a sensação de serem iluminados, pertencendo assim, aos eleitos do virtual, e os outros com cara de palhaços, completamente desconcertados pelo esforço inglório de fixar os olhitos e nada lhes saltar do papel.
Eu, pertenci durante algum tempo a um subgrupo dos "outros", que pensava: "estão a mangar comigo!"..., "claro que a terceira dimensão é dada pela posição e cor dos objectos, colocados no suporte, tal e qual como se faz na pintura, explorando a noção de perspectiva".
Um dia, perdida por uma livraria, naquele exercício rotineiro, abre livro, arruma livro, verifico que tenho nas minha mãos um pequeno livro de estereogramas, com a chave de todo o paradoxo vivido pelos iluminados e pelos "outros".
Não o larguei mais!
Esse pequeno livro abriu uma nova janela no meu olhar!
Para já, o prefácio inicia-se com uma frase brilhante, que passo a transcrever:"O cérebro humano é a máquina de realidade virtual mais incrível jamais descoberta. As tentativas feitas ao longo da história para utilizar meios tecnológicos na criação de ilusões tridimensionais têm tentado reproduzir artificialmente, o que o sistema perceptivo humano faz naturalmente.
"Finalmente, alguém explica que, os iluminados, não são afinal iluminados, coisa nenhuma, e os outros, são de facto, muito mais que "tadinhos"!
Afinal todos os seres humanos com dois olhos a funcionar, conseguem ver em três dimensões, dado que cada um deles observa a realidade de forma independente, e as duas imagens se fundem posteriormente no cérebro - princípio da estereoscopia.
Para este fenómeno ter sucesso, ou seja, poder ser visualizada a terceira dimensão, sem a ajuda de qualquer dispositivo óptico, basta relaxar os músculos ópticos e deslocar o ponto de focagem do olhar. Às vezes é necessário alguma prática, o que este livrinho pode dar uma ajuda, já que ensina de forma muito concreta a posicionar o olhar sobre o suporte.
Sobre a história da estereoscopia, pode-se referir que esta, antecede a própria fotografia, referindo-se o ano de 1838, como o ano da invenção do par e do visor estereoscópico. Meus amigos isto já se iniciou há dois séculos atrás, sem ajuda dos PCs!
Os interessados poderão realizar uma busca na net, e encontrarão imensos exemplos que vos irão deliciar.
O livro referido é:"Estereograma" Howard Rheingold, Gradiva Publicações, Lda - 1994
Anexei o tema a este fio porque pretendo escrever de seguida sobre DALI.
Os estereogramas confirmam de forma inequívoca, que ao olharmos para o mundo à nossa volta, há muitas formas de o vermos e de nos relacionarmos com ele, depende apenas da forma como o aprendemos a ver. Nem tudo o que parece é, e nem tudo se esgota naquilo que parece ser.
As nossas verdades, afinal podem não o ser.
Anabela Quelhas
editado em www.sanzalangola.com em 20/04/2006

Ser ou não ser


Platão propõe-se resolver a tensão entre Heráclito e Parmênides: para o primeiro, o ser é a mudança, tudo está em constante movimento e é uma ilusão a estaticidade, ou a permanência de qualquer coisa; para o segundo, o movimento é que é uma ilusão, pois algo que é, não pode deixar de ser, e algo que não é, não pode ser, assim, não há mudança.
Para Platão com a sua Teoria das Idéias refere:
- O que há de permanente num objecto é a Idéia, mais precisamente, a participação desse objeto na sua Idéia correspondente. E a mudança ocorre porque esse objeto não é uma Idéia, mas uma incompleta representação da Idéia desse objecto.
Osiris
editado em www.sanzalangola.com em 17/04/2006

Friday, September 15, 2006

Brasília



Quando era jovem, quase a concluir a década de teen-ager, foi-me exigido leccionar uma aula de três horas, tendo como público, 50 indivíduos ávidos de saber, rigorosamente atentos, inflexíveis e determinados nas suas avaliações. O tema sorteado foi, as novas cidades de Brasília e Chandigarh (capital de Punjabe, Índia).
Nessa época, os meios áudio visuais, encontravam-se quase na pré-historia; teria disponível um projector de diapositivos, daqueles que avariam na hora mais imprópria, e que queimam a película fotográfica, quando não se lhe presta atenção e dedicação, durante alguns minutos.
Fiquei aterrada!
A minha reduzida simpatia pela cidade de Brasília (Chandigarh, ignorava-a até aquela hora!...), adornava ingenuamente o ramalhete da minha inexperiência juvenil.
A minha opinião sobre o Brasil, oscilava entre a paixão desmedida pelas duplas Jorge Amado e a sua Gabriela, Chico Buarque e Construção, e entre o desapontamento pelo bigodinho à Clark Gable, que os homens ainda insistiam em ostentar, já nos finais dos anos 60.
Perante uma situação difícil, a minha tendência inata, é sempre fugir para a frente, ou seja mergulhar de cabeça nos problemas.
Como digerir isto?
Como apresentar uma nova cidade, Brasília, pensada a partir do zero por Lúcio Costa e Óscar Neimayer, constantemente caricaturados, pela célebre frase, ridiculamente formalista: " Na arquitectura, o que interessa é ser bonito, se funcionar tanto melhor!!" (proferida com pronúncia brasileira)?
Como motivar a minha plateia para um tema que à partida, tinha no subconsciente de cada um, uma expectativa negativa?
Brasília é uma das consequências da política de Juscelino Kubitschek, construída entre 1956 e 1960..Localização - planalto central - Estado de Goiás
Objectivos:
- mudança da capital
- integrar o interior do país- gerar novos empregos
- ocupar mão de obra nordestina
- promover o desenvolvimento do interior do país
- desafogar o centro sul do território brasileiro.
Actualmente classificada como Património Cultural da Humanidade.
O projecto pertence ao arquitecto Lúcio Costa, foi imaginado segundo os princípios da arquitectura moderna (CIAMS) e a Carta de Atenas (1942) - zonas urbanas distribuídas segundo as suas funções, habitação, lazer, trabalho e circulação.
Segundo Lúcio Costa o projecto nasceu de um gesto simples, hoje denominado minimalista (está mais na moda), o sinal de uma cruz, que serve para assinalar um sítio, um lugar... adaptado à morfologia do local!....será trêta?...mas resultou, ajudou a mistificar o gesto criativo, tão simples e "ingénuo", e que transporta mecânicas de raciocínio tão complexas, lotadas de processos e de metodologias sucessivas de avaliação/decisão, como é projectar uma cidade!
Este pormenor..., reparei, encantou a minha assistência!
O traçado urbano e o simbolismo visual, adquire força na imaginação popular que o transforma num pássaro ou num avião. Estas formas concretas facilmente identificadas e retidas na memória colectiva, acabam por se converter na imagem do traçado urbano da capital brasileira. Na intersecção destes dois eixos, localiza-se exactamente o centro da cidade, que abriga os três poderes (Praça dos Três Poderes, legislativo, executivo e judiciário), a Catedral (capaz de abrigar 2.000 pessoas), museus e monumentos, tudo pensado numa escala monumental, transbordando simbologias nas formas arquitectónicas adoptadas -isto enche as medidas a qualquer aspirante a arquitecto!
O eixo correspondente às asas contêm as super-quadras, comércio e serviços, ladeados por um dos lados, por um gigantesco lago artificial de Paranoá, formando pequenas penínsulas onde se localizam, mansões e embaixadas.
" Super-quadra" ficou conhecida internacionalmente - edifícios de 6 pisos, assentes em pilares, com espaços de lazer directamente ligados à habitação, dando alguma autonomia e isolamento a estas "quadras".
"Brasília não tem esquinas", comentário ao facto desta cidade ser dominada pelos grandes espaços abertos, notando-se a ausência, da "rua corredor" tradicional. Os condicionalismos e as pré-referências, que sempre assistem a qualquer intervenção arquitectónica, são aqui inexistentes. A geometria é a chave orientadora de todo o processo criativo, as formas e as volumetrias surgem completamente livres de espartilhos abrindo, um vertiginoso caminho de total liberdade aos seus mentores, convertendo esta experiência numa utopia possível de realizar, só comparável à acção do Grande Arquitecto (Oi Carranca!).
.... slides projectados, uns atrás dos outros....beeeeeeeem, a plateia rendeu-se, já pouca atenção prestou ao final da aula (foi assim ou não, companheiro Rui?), e às interrogações que ficaram no ar (parte mais importante da aula)... completamente embuídos no prazer do exercício de projectar uma cidade nova, inundados pela utopia e preservados pela ingenuidade da idade.
Para os jovens europeus, qualquer cidade tem uma origem histórica - ou foram os suevos, ou os romanos, ou...- encontrar a possibilidade em que essa premissa não existe, torna tudo diferente, inverte toda a lógica projectual, que assiste o acto criativo, criando uma expectativa facilmente positiva, de liberdade. Esta nova cidade passou a encantar-me, pois é uma das mais ousadas realizações da arquitetura moderna mundial, e tem-me acompanhado como referencia arquitectónica, e exercício urbanístico na organização do território, dando-me oportunidade de a ver crescer, e evoluir, dando sempre uma atenção especial a todos os problemas que se interlaçam com ela.
A construção desta cidade em 4 anos, obrigou à deslocação de grandes massas de mão-de-obra de varias regiões do Brasil, que viam em Brasília a possibilidade de uma vida melhor e mais digna, sonho alimentado pelos políticos na época.
Esta expectativa positiva era desmedida e demasiado irreal. O símbolo do urbanismo moderno não conseguiu cumprir a esperança do povo. A cidade ideal, orientada pela Carta de Atenas e pelos conceitos do urbanismo racionalista apenas satisfaz a classe média e alta, que usufruem do esquema de vida adaptado a este espaço urbano, onde não faltam os jardins, os grandes espaços, a sectorização adequada, enfim tudo o que é necessário ao bem estar, porém à custa de uma forte segregação social - as cidades satélites que existem desde o inicio da construção da cidade.
O plano de Lúcio Costa não previu o tal fluxo migratório de trabalhadores essenciais para a construção da cidade, não foi prevista uma rede urbana de apoio, com infraestruturas que acolhessem esta população e permitisse a sua fixação e desenvolvimento; os trabalhadores foram-se acumulando no exterior da cidade formando um cordão de cidades satélites que ainda hoje existem. A capital do sonho e da esperança, rapidamente vislumbra a pequena distancia, a miséria, a falta de condições sanitárias e o pó vermelho das cidades, dos eternamente iludidos e enganados.
Brasília foi planeada para uma população de apenas 500.000 habitantes.
A população total de Brasília (incluindo as cidades satélites) já é de mais de 2 milhões de habitantes.
"A longa distância entre as satélites e o Plano Piloto isolou dois terços de sua população metropolitana que reside nos núcleos periféricos, além de gerar problemas de custo para o transporte coletivo", admite Lúcio Costa.
Entretanto, como toda cidade grande, existem também favelas, grandes concentrações de áreas com população de baixa renda, principalmente no entorno. O turista que se dirige à cidade de carro, percebe logo isso nas imediações da cidade. Isso, em razão de promessas políticas de governadores do Distrito Federal, que incentivaram o êxodo de outras regiões para a cidade o que acabou causando o aumento do desemprego e da violência.
Como será com a nova Capital de Angola, que alguns insistem em apontar como saída para o caos urbanístico de Luanda? Serão replays de quatro décadas atrás?
Anabela Quelhas
editado em www.sanzalangola.com em 9/04/2006

Se o mundo fosse óbvio


"Se o mundo fosse óbvio, a arte não existiria. A arte ajuda-nos a penetrar na opacidade do mundo" (Albert Camus)
Ser-se artista é ser-se permanentemente insatisfeito, irrequieto, curioso, preocupado com tudo o que o rodeia, inconformado com tudo que poderia ser perfeito e não o é. A insatisfação sentida é o motor para a mudança, para a rebeldia, para a transgressão, para a inovação, para a criação, abrindo novos horizontes à nossa existência, sempre em sentido contrário ao conformismo, à rotina, ao apaziguamento, à felicidade ilusória.
Anabela Quelhas
editado em www.sanzalangola.com em 31/03/2006

Keridos Kandengues - a melhor estória de Jota Pê:


Estávamos todos a passar o fim de semana, em casa dos Vôvôs, contagiados pela euforia do bem receber e do ser bem recebido - os problemas ficaram retidos no trânsito de sexta feira, e todos, velhos e novos, compartilhavam uma alegria contagiante.
Só havia um probleminha. Jota Pê, kandengue de 4 anos, tinha um mau acordar! Todos os dias, despertava de mal com a vida, com um génio "do cão", embirrando, durante uma meia hora, com tudo e com todos! A hora de vestir transformava-se num verdadeiro melodrama. Os problemas surgiam donde menos se esperava.... os sapatos, as meias, as camisolas, as calças, .... Como se costuma dizer "... se não era do c. era das calças"!
Estava na cozinha, a preparar o pequeno almoço de Jota Pê, e este entra pela mão da Vóvó, na sua resmunguice habitual, de cara feia, mal disposto ...
Vôvô Quelhas, já farto da cena matinal, presenciada ao longo de vários anos, inteira-se do problema e condescendente fala com toda a paciência com o neto. Este explica-lhe que está aborrecido com comprimento das mangas da sua camisa, não são do mesmo tamanho! Habilidosamente, estende os braços, para comprovar, estendendo mais um braço do que o outro (matreirice, que teimava usar habitualmente), e mostrando as suas mangas desiguais!
Para estupefação minha, vejo Vôvô Quelhas, a munir-se de uma tesoura, e concordando sempre com o neto, resolve acertar os comprimentos. Pacientemente corta um dos punhos da camisa, tornando-o visualmente alinhado com o outro, e reforçando sempre que Jota Pê, tinha toda a razão.
Se eu fiquei estupefacta, Jota Pê quase lhe saltavam os olhitos das órbitas. Em silêncio, viu a sua camisa de xadrezinho azul, a ser mutilda pela tesoura e pela paciência do compreensivo Võvô.
No final, todos concordamos que tinha ficado muito bem, uma autêntica obra de arte, Yves Saint Laurent não teria feito melhor!
Jota Pê, tomou o seu pequeno almoço em silêncio, e passou a acordar com muito melhor disposição!
Moral da estória: AH grande Vôvô! Às vezes é absolutamente necessário e urgente passar da teoria à prática!
Mãe Osíris (bjinhos para todos os kandengues do mundo )
editado em www.sanzalangola.com em 25/03/2006

Thursday, September 14, 2006

a cadeirita

A cadeirita de fitinhas das esplanadas de Luanda
Ao folhear uma revista sobre mobiliário (que não era da Ikea - tem um pouco mais de qualidade, o que não é difícil) deparo com o desenho de uma cadeira de exterior (patio chair), que é, nem mais nem menos, a cadeira das esplanadas de Luanda.
Estrutura metálica e metros e metros de fita plástica colorida, que preenche o espaço destinado ao utilizador, de forma mais ou meos ergonómica e arejada.
Lembrei-me das esplanadas repletas daquelas cadeiras feitas em série, fabricadas não sei onde, verdes, azuis, amarelas e cor de laranja, que serviram de cenário a subservientes engraxadores de sapatos, que esperavam pacientemente que os seus clientes resolvessem sentar para tomar umas loiras.
Cadeiras que permaneciam noite e dia no exterior, e assistiam resignadas à passagem atarefada, feita de idas matinais e regressos ao fim do dia, de pretos trabalhadores, ao longo das avenidas subitamente interrompidas nos musseques.
Surpresa minha, uma cadeira concebida por um designer dos anos 50! E eu que maltratava aquelas cadeiras, pois tinhamos um pacto de antipatia permanente... e elas teimavam em habitar em minha casa!
De vez em quando uma daquelas fitas rompia-se, cansada, esgotada, do peso que suportavam, ou dos sapatos dos putos indisciplinados e atrevidos, que as utilizavam como cama elástica.
Fita partida, cadeirita estragada!.... convertiam-se em cadeiras moribundas, com aspecto geriátrico, com menos duas ou três fiadas de fita, para possibilitar um inestético nó, adiando a sua ida para a sucata.
Que amores despertariam essas cadeiras aos seus fiéis e numerosos consumidores?
Por mais que olhe para a dita, não há meio de eu gostar!!!....
Anabela Quelhas

ao meu pai

Ao meu pai:

Perdia-se numa conversa comigo. Saíamos sem destino, deambulando por Sta Catarina, 31 de Janeiro, Mouzinho da Silveira, observando, sentindo odores, apreciando arcos e cornijas, observando as pessoas,

... sobe escada, desce escada...

...interseptando afirmações com interrogações, num dialogo sem fim...

... os dois com mania de andar depressa! Não passeávamos..., sempre marcha rápida, como se alguém nos esperasse nalgum sítio!... quando o assunto exigia mais concentração parávamos... e esticávamos conversa, às vezes arranjávamos um sitio para sentar,... um muro, um banco... até um degrau servia!... espreitávamos os azulejos em S. Bento, e comíamos castanhas na praça... mais um eléctrico a passar, mais uma chuvinha molha tolos...

- Oh Muoço!!! num bai um raminho de rosas? ... manjerico? Oh, só no Som Joõe, mor!!!

... passagem obrigatória pela Bertrand, o lanche no Majestic, saboreando o brilho dos espelhos daquela jóia facetada, entre uma meia torrada e um pingo!

- Sai um cimbalino!... os cartazes do teatro de S. João... distraído na conversa, às vezes acordava na feira da Vandoma.

-Trazes-me para as velharias?... Para velho basto eu!

- eu sorria, maliciosamente, por este destino, secretamente planeado e apreciando os cabelos brancos de meu pai, que lhe ficavam tão bem, no seu porte ainda jovem. Contornar a Sé, referências a Guerra Junqueiro e António Nobre, observar em picado a Igreja dos Grilos e o seu adro sempre com crianças a brincar...

-... por ali é que é a famosa Rua Escura? ... cenário de tanta história vadia?... muralha sueva, a porta do sol e a dos olivais, lá no extremo oposto na Cordoaria... passar pela igreja de Sta Clara e ir até ao fim da muralha fernandina, espreitar pelas ameias e olhar a serra do pilar e o rio, tantas vezes prateado apesar de Ouro no baptismo... descíamos à cota baixa pelas escadas das Fontaínhas, desembocando na Ribeira.

"A ponte é uma passagem, prá outra margem

Desafio pairando sobre o rio

A ponte é uma miragem.."

Liiiiindo!!!!!!!!!!! (Já Fumega)

Admirado por eu gostar de jantar pelas aquelas arcadas... ver as marcações das cheias pelas paredes, recordar a angústia daquelas gentes, à espera de ver as águas a subir, algumas vezes presenciada por mim.

Atravessar o rio pelo tabuleiro de baixo, pisar em Gaia, ver as caves e sentir o aroma e o sabor de um vintage, enquanto admiramos o perfil da cidade tripeira, e identificamos os monumentos.

...discordando sempre sobre as obras da intervenção SAAL, e paragem obrigatória no cubo de Zé Rodrigues: Lembrar o Duque da Ribeira, salvador de almas quase perdidas, e olhar de mais perto, toda aquela água, a deslizar suavemente até à Foz, o cais da Ribeira e o da Estiva. ...visitar o pequeno labirinto da Casa do Infante, recuar na história até à 2ª dinastia.

Regressar pela Rua das Flores sem vislumbrar qualquer tragédia, apenas a concentração de ourivesarias, espreitar o barroco, depois do largo dos Lóios, confirmar a intervenção de Almada.

As filas nas paragens de autocarro,...

-... está cansado para o regresso?

- Em vez de esperarmos na fila vamos andando.

- O 20 ou o 78 estão sempre a passar!...

- Olha ali mais acima o que andam a fazer? Vem-me mostrar! De quem é aquela estátua?... o grande espaço onde a cidade manifesta a sua vontade colectiva, D. Pedro IV ( afirmação de liderança e resistência contra quem atacava a partir do sul) dum lado, e Garrett do outro!... a meio a "Menina Nua" de Henrique Moreira. O Comércio do Porto... atalhar caminho pela rua Formosa, e passar ao Bolhão quase a fechar.

Mais um regresso a casa.

Poupou-me sofrimento, evitou que eu vivesse a violência e ensinou-me a ser teimosa, persistente, tolerante, a ter opinião própria e a discordar com ele.

Anabela Quelhas

Tuesday, September 12, 2006

O olhar fauve


"O Olhar Fauve"
Exposição de pintura proveniente do Museu de Bordéux, agora exibida no Museu do Chiado em Lisboa, até 19 de Março.
A preocupação principal dos fauves (as feras) era conceber uma arte de impulso vital, com enfoque nos problemas pictóricos, desvendando o dualismo entre cor e construção dos elementos, forma, plástica, volume e espaço.Em meio às grandes transformações sociais e políticas(inicio do século XX), os fauves não tinham nenhuma posição política definida.
O expoente máximo desta tendência é Henri Matisse.

Hoje


Hoje estamos lhe ocupando quase toda a praia......................... .

editado em www.sanzalangola.com em 8/03/2006

Dia Internacional da Mulher


Para todas as mulheres/mães das numerosas Praças de Maio desse mundo, para as reclusas, para as toxicodependentes, para as prostitutas, para as escravas do século XXI, para as humilhadas, para as violentadas nos seus direitos, para as sem abrigo, para todas aquelas que foram até ao fim da linha e conheceram o inferno, .., que um arco íris de esperança brilhe todos os dias.
Anabela Quelhas
editado em www.sanzalangola.com em 8/03/2006

Sunday, September 10, 2006

Com as mãos se faz a paz


"Com mãos se faz a paz
E se faz a guerra.
Com mãos tudo se faz e se desfaz.
Com mãos se faz o poema
-E são de terra.
Com mãos se faz a guerra
-E se faz a paz.
De mãos é cada flor cada cidade.
Ninguém pode vencer estas espadas:
Nas tuas mãos começa a liberdade."
Manuel Alegre, poeta português.

DIA INTERNACIONAL DA MULHER


Mulheres de Atenas ,
Chiquo Buarque e Augusto Boal
Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Vivem pros seus maridos,orgulho e raça de Atenas
Quando amadas, se perfumam,
Se banham com leite,se arrumam
Suas melenas
Quando fustigadas, não choram
Se ajoelham, pedem, imploram
Mais duras penas, cadenas
Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Guardam-se pros maridos, poder e força de Atenas
Quando eles embarcam, soldados
Elas tecem longos bordados
Mil quarentenas
E quando eles voltam, sedentos
Querem arrancar, violentos,
Carícias plenas,
Obscenas
Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Despem-se pros maridos, bravos guerreiros de Atenas
Quando eles se entopem de vinho
Costumam buscar o carinho
De outras falenas
Mas no fim da noite, aos pedaços,
Quase sempre voltam pros braços
De suas pequenas
Helenas
Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Geram pros seus maridos os novos filhos de Atenas
Elas não tem gosto ou vontade
Nem defeito, nem qualidade
Têm medo apenas
Não têm sonhos, só tem presságios
O seu homem, mares, naufrágios,
Lindas sirenas
Morenas
Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Temem por seus maridos, heróis e amantes de Atenas
As jovens viúvas marcadas
E as gestantes abandonadas
Não fazem cenas
Vestem-se de negro, se encolhem,
Se conformam e se recolhem
As suas novenas,
Serenas
Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Secam por seus maridos, orgulho e raça de Atenas.
Beijo do tamanho do mundo a todas as mulheres e homens angolanos
Anabela Quelhas

IMAGINE

Imagine
John Lennon

Imagine there's no heaven,
It's easy if you try,
No hell below us,
Above us only sky,
Imagine all the people
living for today...
Imagine there's no countries,
It isnt hard to do,
Nothing to kill or die for,
No religion too,
Imagine all the people
living life in peace...
Imagine no possessions,
I wonder if you can,
No need for greed or hunger,
A brotherhood of men,
imagine all the people
Sharing all the world...
You may say I'm a dreamer,
but Im not the only one,
I hope some day you'll join us ,
And the world will live as one

Imagine que não exista nenhum paraíso,
É fácil se você tentar.
Nenhum inferno abaixo de nós,
Sobre nós apenas o firmamento.
Imagine todas as pessoas
Vivendo pelo hoje...
Imagine que não exista nenhum país,
Não é difícil de fazer.
Nada porque matar ou porque morrer,
Nenhuma religião também.
Imagine todas as pessoas
Vivendo a vida em paz...
Imagine nenhuma propriedade,
Eu me pergunto se você consegue.
Nenhuma necessidade de ganância ou fome,
Uma fraternidade de homens.
Imagine todas as pessoas
Compartilhando o mundo todo.
Você talvez diga que sou um sonhador,
Mas eu não sou o único.
Eu espero que algum dia você se junte a nós,
E o mundo viverá como um único.

I HOPE SOME DAY YOU' LL JOIN US
Osíris

Freud

Freud dizia que em todos nós existe um impulso para a destruição.
Da mesma maneira que existe um impulso para vida, para criatividade, para o prazer e para o amor.
Estes impulsos estão sempre em conflito, e esses conflitos vão sempre acompanhar o homem.
Se não reconhecermos isto, acreditaremos em qualquer teoria que defenda que a guerra é a única solução para o mundo.
Na verdade, todas essas teorias e crenças que defendem a guerra estão a serviço deste impulso destrutivo que existe em todos nós. Por isso fazem tanto sucesso, porque encontram eco em todos nós.
Temos que nos conhecer para a guerra poder acabar.
(isto aplica-se às guerras e às guerrinhas)
Osíris
"A pergunta é: existe uma maneira de libertar os homens da fatalidade da guerra? É sabido que, com o progredir da ciência moderna, responder a esta pergunta tornou-se uma questão de vida ou de morte para a civilização por nós conhecida; e no entanto, apesar de toda a boa vontade, nenhuma tentativa de solução deu qualquer resultado visível. (...) Concluindo: falei até agora só de guerras entre Estados, ou seja, de conflitos internacionais. Mas estou perfeitamente consciente do fato que o instinto agressivo também se manifesta de outras formas e em outras circunstâncias (penso nas guerras civis, por exemplo, em certa altura devidas ao fanatismo religioso, hoje a fatores sociais; ou ainda às perseguições de minorias raciais)."
(Albert Einstein, Carta a Freud, julho de 1932)
"O senhor admira-se do fato de que seja tão fácil entusiasmar os homens para a guerra e suspeita de que algo, uma pulsão de ódio e de destruição, atua neles, facilitando tal incitamento. Mais uma vez, não posso senão partilhar sem restrições sua opinião. (...) Ora, as atitudes que nos foram impostas pelo processo da cultura são negadas pela guerra do modo mais cruel e, por isso, erguemo-nos contra a guerra; não a suportamos mais, e não se trata aqui de uma aversão intelectual e afetiva; em nós, pacifistas, agita-se uma intolerância constitucional, por assim dizer, uma idiossincrasia elevada ao máximo. E parece que as degradações estéticas da guerra contribuem para nossa rebelião em não menor grau do que suas atrocidades. (...) Por agora só podemos dizer: tudo o que fomente a evolução cultural atua contra a guerra."
(Sigmund Freud, Carta a Einstein, setembro de 1932)
editado em www.sanzalangola.com em 7/03/2006

O Beijo

O Beijo, de Gustav Klimt
Oiço Abrunhosa, embalada na cadência das suas palavras, que emanam sedução, cumplicidades, sentires profundos, capazes de criar interligações com registos visuais... e deixo-me navegar em mares de cetim....
Viagens que se perdem no tempo,
viagens sem princípio nem fim,
beijos entregues ao vento,
e amor em mares de cetim.
Gestos que riscam o ar,
e olhares que trazem solidão,
pedras e praias e o céu a bailar,
e os corpos que fogem do chão.
...enquanto escrevo, sobre o "O Beijo" de Gustav Klimt (1862 - 1918 pintor simbolista austríaco), grande tela pintada em 1908, uma das obras mais sensuais da história da pintura. Representa o símbolo de união.
Leva os meus braços,
Esconde-te em mim,
Que a dor do silêncio
Contigo eu venço
Num beijo assim.
O erotismo do casal de apaixonados é transmitido através de linhas sensuais que emergem no eixo de simetria com a figura feminina.
A exploração dos desenhos decorativos das roupagens de ambos, jogando com os violentos acordes cromáticos, fazendo o contraste entre quadriláteros e circulos, num simbolismo desmedido dum jogo de sedução, inundado de dourado - antagonismo ou complementaridade?
Quero que saibas
Que sem ti não há lua,
Nem as árvores crescem,
Ou as mãos amanhecem
Entre as sombras da rua.
Curiosamente, a única parte realista desta pintura, tão subtilmente erótica, é o espaço ocupado pelos rostos.
Tenho tantos segredos
Que te quero contar
E uma noite não chega,
Diz que podes ficar.
Klimt inspirou-se na sua relação com Emile, sua namorada ou amante, e alguns críticos salientam que esta é uma mulher submissa, devido à inclinação do seu rosto, e ao nível inferior em que é representada.
Diz-se que é o homem que domina e que toma a iniciativa do beijo, e que a mulher abandona-se, o rosto é passivo, e as suas mãos crispam-se.
Enfim nós os dois,
Os teus gestos nos meus,
.... quem vai adivinhar os mistérios do amor?
Quem me dera poder conhecer
Esse silêncio que trazes em ti,
Quem me dera poder encontrar
O silêncio que trazes por mim.
A mulher aparece envolvida na roupagem masculina, num abraço apaixonado, e numa posição efectivamente inferior, mas perfeitamente equilibrada com o seu rosto, extremamente feminino e belo, sendo o único visível na sua totalidade.
eu não sei, que mais te posso dar
um dia jóias noutro dia o luar
gritos de dor, gritos de prazer
que um homem também chora
quando assim tem de ser
No amor, é tão dificil distinguir submissão, de entrega, de sedução consentida, de erotismo, de sinalética de paixão...... O beijo, aquele momento que sucede aos olhares que se olham, dialogando no silêncio.
Tudo o que eu te dou
tu de das a mim
tudo o que eu sonhei
tu serás assim
tudo o que eu te dou
tu me das a mim
tudo o que eu te dou*
O Beijo de Klimt e Mona Lisa comparam-se em relação ao fascínio que exercem, e ao seu simbolismo que nunca foi completamente descodificado.
* poemas de Pedro Abrunhosa
Anabela Quelhas (22/02/06)
editado em www.sanzalangola.com 5/03/2006